quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Homem: principal vítima do machismo (1)

O feminismo, assim como o senso comum, alimentam duas fantasias: a) o machismo foi uma espécie de sistema absurdo; b) as mulheres sempre foram e continuam sendo as principais vítimas do machismo.
O machismo surgiu da divisão sexual do trabalho e do sistema de compensações que essa divisão instaurou.
Em quase todas as sociedades primitivas, se não em todas, coube ao homem guerrear e caçar e à mulher cuidar das crianças; as sociedades que se tornaram sedentárias delegaram também à mulher a tarefa de cuidar do espaço doméstico.
O homem se tornou guerreiro e caçador porque, no que se refere à maioria dos indivíduos, sempre foi mais forte, mais rápido e, talvez, mais predisposto hormonalmente aos riscos próprios dos ambientes mais agressivos.
A mulher se tornou cuidadora das crianças e do espaço doméstico porque é ela a gestante e é ela que amamenta e, talvez, seja menos predisposta hormonalmente aos riscos próprios dos ambientes mais agressivos.
O homem foi sempre constrangido a exibir uma fortaleza maior do que aquela que realmente lhe corresponde; o homem sempre teve menos direito à exibição da própria fraqueza.
À mulher foi negada a maior parte do poder comunitário e doméstico; ao lado da submissão, porém, foi-lhe concedida a legitimidade do autocuidado.
Montou-se um sistema que se equilibrava sobre um princípio: quem se arrisca mais e se cuida menos manda mais.
Ele, portanto, nada tinha de absurdo; era tão-somente a expressão de uma funcional divisão sexual do trabalho, calcada nos atributos físicos médios de homens e mulheres
Esse sistema se perpetuou pela maior parte do percurso civilizatório, e ainda não foi extinto. Foi nos países ricos do Ocidente que esse sistema mais recuou, porém, mesmo aí, suas marcas ainda estão presentes.
Por que o machismo recuou?
Por causa sobretudo das revoluções tecnológicas que tiveram início na segunda metada do século XVIII e prosseguem até hoje. Essas revoluções minimizaram o papel dos atributos corporais na condução dos negócios humanos. Os cargos mais importantes e bem pagos na maior parte do mundo, apesar de ainda serem ocupados majoritariamente por homens, não necessitam de qualquer atributo específico de um corpo masculino. Ao mesmo tempo, muitas mulheres têm acesso a um sem-número de equipamentos e serviços que prescindem de sua presença no lar durante a maior parte do tempo.
Mas por que o homem é a principal vítima do machismo?
Porque enquanto o machismo vigeu como sistema legitimado socialmente, o risco das guerras e das tarefas de proteção e segurança sempre recaiu mais sobre ele. Isso significou que os homens tendiam a morrer mais precocemente do que as mulheres, porque, desde sempre, nada matou mais do que a guerra.
Mas, e agora que a tecnologia tornou o machismo um sistema obsoleto?
Ora, mesmo agora, são majoritariamente os homens que fazem a guerra e cuidam da segurança.
As mulheres vivem ainda muitos desafios e ainda sofrem a violência gerada pelo machismo.
Porém, em termos de violência, nada se compara à mortandade dos homens em conflitos internacionais.
Além disso, ainda não caiu a ficha para os homens de que os comportamentos arriscados (no trânsito, no regime alimentar, nos conflitos de interesse cotidianos, que muitas vezes degeneram em agressão) não fazem mais sentido, porque não melhoram a vida da comunidade e não trazem compensações significativas. Assim, são os homens que morrem mais no trânsito, são eles que morrem mais pelo abuso do álcool e do tabaco e pela falta de consultas preventivas aos profissionais de saúde, são os homens que morrem mais vítimas de agressões à mão armada.
Depois eu continuo.

2 comentários:

  1. Manel, o homem além de produto, tb não é reprodutor do machismo? Onde reside o vício a ser sanado: no homem ou na sociedade?

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  2. sim, sem dúvida. e, ao reproduzirem o machismo, os homens se perpetuam como suas principais vítimas (embora não se possa dizer, óbvio, que os homens sejam os únicos a reproduzir o machismo).
    gd abraço, João!

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