segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Diferença, inovação, heterogeneidade

O longo processo de modernização, que prossegue em nossos dias, vem conferindo, desde o princípio, embora em trajetória não-linear, valor crescente à diferença.
No que se refere aos indivíduos, a diferença na identidade e na atuação pode se exercer como heterogeneidade ou inovação.
É evidente que, embora a heterogeneidade seja mais valorizada do que já foi, é, entre as duas, a inovação que desfruta de maior prestígio.
O indivíduo heterogêneo é aquele que recolhe em si, em combinação própria, traços já existentes, criados por outros indivíduos ou culturas.
O inovador cria traço inédito.
A propósito de um e outro, o comentarista típico sentencia: "Sim, sim, não há dúvida de que o heterogêneo tem lá seus méritos, afinal de contas teve independência suficiente para recolher traços identitários e atitudinais e recombiná-los de acordo com seu gosto e vontade. Porém, o inovador é sem dúvida superior, porque abre fronteiras".
Esse tipo de consideração tem dois problemas: a) o tal comentarista típico, mais ou menos explicitamente, tende a desenvolver uma postura de subserviência em relação ao inovador; portanto, seu compromisso com a inovação é essencialmente retórico, uma vez que, na prática, seu compromisso maior, identitário e atitudinal, é com a repetição, via postura subserviente; b) a heterogeneidade, além de ser por si mesma já alguma inovação, uma vez que representa recombinação única e original do já existente, tem seu valor maior na disposição existencial de trilhar caminho próprio, que pode se afirmar acima ou à margem das demandas de inovação; em outros termos, o indivíduo heterogêneo pode estar dizendo: "A força que trago em mim mesmo, ao afirmar minha heterogeneidade, é tão exuberante que se afirma como vigor que impacta e redefine o mundo à revelia de qualquer demanda por inovação".
A inovação é preciosa, e a heterogeneidade não é mera versão medíocre do diferente.
As duas formas fundamentais da diferença são, ao mesmo tempo, ponto de chegada e motor da modernização.
As sociedades que se modernizam com maior sucesso são aquelas que acolhem mais a diferença, como inovação ou heterogeneidade.
Os Estados Unidos, creio, apesar da pecha que muitos lhes atribuem como país da acriticidade, são mais avessos ao cultivo da humanidade como rebanho do que o Brasil.
No Brasil, além das religiões, diferentes ideologias – de esquerda e de direita, politicamente corretas ou incorretas – obtêm  sucesso relativamente amplo no assujeitamento dos indivíduos; quer dizer, conseguem reduzir muitos e muitos indivíduos a uma antimoderna semelhança, via repetição e homogeneidade.
Nos Estados Unidos, apesar do ativismo intenso do "politicamente correto" e do conservadorismo religioso e político, há muito mais espaço para os indivíduos criarem, via heterogeneidade ou inovação, sua própria vida.
Deve-se a isso, como uma das razões fundamentais, o fato de, aqui nos EUA, a modernização se encontrar em estágio mais avançado e a sociedade estadunidense colher mais e melhores frutos propiciados pela diferença.

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